26 de agosto de 2010

sou sua Orfeu, deixe-me não te olhar uma última vez.

Eu só conseguia pensar na lenda de Orfeu. Ele enfrentara o Mundo Inferior para salvar a alma de sua esposa e a única coisa que deveria ter feito para obter êxito era não olhar para trás, ou seja, não olhar para ela. Mas ele olhou. Mas ele voltou-se para ela, apenas para se certificar de que ela estava bem. De que ela estava ali.
Eu só conseguia pensar nisso - não que ele fosse morrer pela segunda vez, era apenas o sentimento, o sentimento de que se eu voltasse a vê-lo, ele morreria mais uma vez dentro de mim. Sei que ele esperava por esse gesto de minha parte, porque, na última instância, eu fraquejava, chorava e corria de volta aos braços dele - e, inevitavelmente, a cada vez que agia assim, pouco dele se esvaía de mim.
Apenas decidi por caminhar reto em passos largos para que, quando quisesse olhá-lo, já seria longe demais para enxergar qualquer coisa. Reconhecer qualquer vulto.
Eu não olharia para trás para manter vivo ainda, dentro de mim, aquele amor que eu só podia sentir sozinha.

Então eu parti.

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