Quem nunca tentou entrar no camarim, para ser só mais um fã
querendo um pouco de atenção num afã secreto de ser notado, não sabe o que é
ser barrado por um segundo, uma fita, dois cones e uma corrente. Eu fui barrada
por um segurança mesmo, que me expulsou não só da fila, mas do salão.
Obrigado você porque graças a sua atitude tive uma bela
volta para casa com o namorado, pensando e refletindo um bocado sobre tudo.Mas esta banda aqui pode ser de qualquer fã. Para mim, pode se encaixar perfeitamente ao Queen (uma pena que eles não são mais uma banda) e o fator que movimenta a vontade pode ser Radio Ga Ga. Pô, eu gosto desta música e me arrepia os pelos ouvir o Fredd movimentar aquela multidão no ao vivo em Wimbley.
Só que não é o Queen. Não nesse momento. Há algum, teria
sido. E teria sido também o Capital Inicial.
E, se é verdade a teoria de universos paralelos, vejo que
tem um eu meu muito feliz fazendo a ideia que eu tive nesse plano: rodando a
estrada e registrando momentos, pensamentos e brincadeiras de uma banda -
afinal, cabe aqui qualquer banda. E me deixa um pouco conflituosa imaginar que
também haja um eu meu cantando (minha memória para música é péssima; não sei
uma letra de cor. Mas, vai saber, talvez este eu tenha desenvolvido um
mecanismo de memorização, por que não um igual aquele do The Mentalist,
envolvendo o palácio de memórias com um lugar em que muito bem conheço?!).
Esse eu tá quieta nos poucos degraus de uma casinha singela
do Rio de Janeiro. Tá olhando a noite que se faz quente e tenta pegar no rosto
algum resquício de brisa fria. Não vem. Mas o laptop no colo ferve. Escrever,
escrever, escrever. Hoje eles fizeram uma entrevista para um site de música
independente, e se bem entendi começou
agora e os caras queriam um grande começo com grande estilo.
Eu concordo que eles escolheram a melhor banda.
Faz tão pouco tempo que estou aqui que nem parece certo
estar aqui, invadindo o espaço de criação deles. Mas prometi ser quieta e
cautelosa - e o tenho sido com tanta precisão que às vezes eles realmente
conseguem esquecer que estou ao lado deles. Isso é ótimo, pois consigo captar
cada um deles em seus momentos quase ínfimos.
Vezes em quando eles me perguntam como está indo, como estou
encaixando as coisas; estão preocupados. Eles se completam tão bem um com o
outro que, secreta e inconscientemente, têm medo de que outros os enxerguem de
outra maneira senão aquela do mundo deles. O mundo dos quatro. Se minha visão é
diferente? Sim. Distorcida? Acredito em que não. Não há como distorcer uma esfera
- seu centro equidista de qualquer ponto.
Na entrevista, quiseram saber se eles possuíam a noção da
projeção deles como banda pelo Brasil. Eu queria ter respondido por eles,
contado a minha história e feito as contas de probabilidade daquilo ter
acontecido, e aí sim chegaríamos a conclusão do tamanho do que são enquanto
banda. Eles se entreolharam por algo que eu poderia dizer ser a menor fração de
tempo registrada. Cumplicidade. Ali conseguiram conectar todas as vias de
pensamentos deles em uma única e fluída que fosse congruente a todos.
Não vou contar o que eles responderam. Que busquem o site e
leiam a entrevista!
Saímos de lá com fome - eles com fome. Paramos em um
restaurante de selv serf. Tem-se os vorazes e o equilibrado, me perguntando
sobre sinergismo dos alimentos e qual componente inibe outro. Falei de alguns
porque, assim, de cara, não me lembro de todos. Ele me disse que andava cansado
e que estava preocupado, afinal, precisa-se de disposição para ser compositor.
Para ser quem a mente dele comanda.
Ele é um grande "expressador", de qualquer coisa.
Ele diz que eu também sou, mas acho que de uma maneira bem mais branda, afinal,
a sonoridade não me é importante. Eu só vou escrevendo, escrevendo e como for,
veio e ficou. Raramente mudo algo. Volto atrás. Teimosia, eu acho. Ele já me deixou dar uma boa observada nos
seus cadernos de rascunhos. Senti-me em êxtase segurando e podendo desvendar
aquelas folhas: eram as coordenadas da mente dele. Toda a caótica organizada em
linhas.
Lindo.
Quase chorei. Não o fiz. Achei muito inapropriado.
Depois do almoço quiseram dormir e irem à praia. Nunca
contei a eles que não gosto de praia. Muita areia para pouca área corpórea.
Fiquei na casa com a desculpa que tinha muita coisa para escrever.
"E tem lugar melhor para escrever do que vendo o mar,
gata?"
Eles me chama assim não porque seja bonita, mas pela minha cara
de menosprezo, que nem dos gatos, e acho que pela independência que criei
deles. Fiz amizade com a Dona aqui do lado, a vizinha que é praticamente a mãe
de todo mundo aqui da vila. Ela me contou histórias bonitas deles, de quando
ela estava doente e não tinha condições de ir ao hospital e um deles a levou.
A noite é quente aqui no Rio. Não me lembro mais das minhas
expectativas quanto a cidade maravilhosa. Me lembro um pouco daquelas que
trouxe na bagagem e do medo de começar esse projeto. Que coisa. Que pena. Não
contei ainda para eles, mas está acabando. Em pouco ou menos tempo não terei
mais o que escrever sobre estes rapazes (meninos. Homens?! Homens).
Aprendi tanto sobre amizade e Amor. Encontrei pessoas que me
permitem a propagação de ideias, as reflexões de olhadas para fora da janela.
Vim aqui para contar uma história, a história de alguns dias deles, dos olhares
deles sobre eles e dessa sincronicidade de energia que os mantêm, como pessoas
individuais, como grupo, como profissionais.
A luz acende.
- Tá acordada ainda?
- Não consegui dormir. Muita coisa acontecendo...
- Muitas coisas acontecem, gata, até nos sonhos. Tenta
dormir que amanhã vamos para um lugar muito legal.
Um copo de chocolate. De leite de soja. De achocolatado
orgânico. Gelado.- Ao menos que queira uma opinião o que está escrevendo.
Eles todos estão curiosos.
Ao longo desses dias eles perceberam a minha visão de mundo
e meu ponto quase de autocrítica. Eles temem o que eu vejo.
Sou quase o Darth Vader da Casinha.
E este meu eu está assim, também achando que é o Darth Vader.
(05/12/13)